Retrospectiva e perspectiva

Rio Amanã, AM, dezembro de 2022. Foto: Adriano Gambarini

Adriano Gambarini

Este ano não foi nada fácil para o meio ambiente. O planeta tem dado sinais frequentes de mudanças que não só estão por vir, mas que, num tempo evolutivo muitas vezes incompreensível para o homem, já estão presentes, com efeitos colaterais resultantes de alterações ao longo de muitas e muitas décadas. Nestes trinta anos viajando como fotógrafo e um tanto mais como viajante com olhar de geólogo ambientalista, já percebi que a maior dificuldade do ser humano em dimensionar as causas dos seus atos para o meio ambiente está no tempo. É difícil, e quando não, tornam irrelevante considerar quais seriam os prejuízos ambientais de determinadas ações num período que exceda uma década ou mais. Assim, mensuram os prós e contras de uma hidrelétrica na Amazônia ou a supressão do Cerrado para monocultura num prazo de apenas alguns anos. Mas os processos evolutivos e adaptativos do meio ambiente geralmente ocorrem num período muito maior que este. É o tempo regendo a si mesmo na dinâmica dos processos naturais.

Definitivamente vivemos num planeta que é uma esfera. Sendo assim, absolutamente tudo que fazemos com e para o meio ambiente reverte aqui mesmo. Não tem válvula de escape, não tem como “jogar pra fora”. A dificuldade maior está em colocar o tempo naquela equação simples que a Terceira Lei de Newton determina: ação e reação. Tudo que o homem realiza interfere no meio ambiente, com maior ou menor intensidade. É fato. O que considero o maior dos problemas é justamente determinar quando isto ocorrerá. Porque quanto maior a demora para esta reação vir, maior será sua intensidade. É um efeito cascata que pode ser visto em tempestades arrasadoras depois de longos períodos de estiagem; secas prolongadas e vendavais de colocar todos as obras erigidas pelo homem, no chão. 

Felizmente, é neste mesmo chão onde muitas sementes podem germinar. Sempre me apeguei a isto, apesar de tudo. Não posso me dar ao luxo de desanimar, mesmo que todos os ventos soprem contra. 

Assim, finalizo 2022 relembrando os projetos de pesquisa que documentei e os resultados positivos na conservação de espécies e biomas ameaçados. Acordo a memória com o povo Paumari satisfeito por mais um ano de sucesso em seu manejo de pirarucu, quando tantas famílias foram agraciadas pelo sustento e esperança de que sua maior tradição, a pescaria, continue sendo uma fonte de renda e permanência na terra dos seus antepassados. Com honra penetro nas terras dos Waimiri-Atroari para registrar os esforços de quem acredita que é possível minimizar os impactos de obras erigidas pelo branco homem, não só sobre esse povo da floresta, mas sobre uma natureza exuberante que é a extensão do espírito de todos os povos tradicionais. 

Rego na lembrança as centenas de mudas de árvores sendo plantadas na encosta nua de um morro onde antes habitava uma imponente Mata Atlântica. E o sorriso estampado no rosto de quem as plantou, sabendo que aquelas árvores trarão sombra e água não para si mesmos, mas para seus filhos e netos. 

Penso na minha derradeira expedição do ano, observando o esforço de uma equipe impecável de pesquisadores e pescadores no trabalho com o boto-rosa. Um trabalho digno de ser replicado, não apenas pela nobre causa de pesquisar este que é um dos animais mais emblemáticos da nossa almejada e imponente Amazônia, mas pela forma como o trabalho ocorreu, em completo respeito e harmonia. 

Se tem algo que eu possa desejar para 2023 é que tenhamos como mantra justamente essas duas palavras: respeito e harmonia. E juntando a palavra tempo possamos construir uma tríade capaz de reconstruir este mundo. 

Com a imensa gratidão por ser parte desta jornada. 

1 responder
  1. Alex Schultz
    Alex Schultz says:

    Excelente texto, muito bem escrito e tem verdade em todas as linhas !!!

    Que 2023 todos nós possamos nos harmonizar com a vida e a natureza!

    Parabéns!!

    Responder

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