O poder das legendas

Dois pesquisadores, cuja autorização de trabalho científico lhes permitia andar armados, passavam num pequeno cemitério de uma comunidade ribeirinha, nos confins da Amazônia. Foto: Adriano Gambarini

Adriano Gambarini
Prezados leitores: olhem para esta foto e digam para si mesmos o que de imediato vem à cabeça. Pois bem, nem tudo é o que parece…
Desde que me conheço por fotógrafo, e até mesmo antes disto, quando era um mero admirador dos olhares alheios e suas frugais revelações em forma de fotografia, tento entender o porquê da informação distorcida que algumas pessoas atribuem às legendas de seu próprio trabalho. Mentir para o leitor é, antes de tudo, mentir pra si mesmo. Afinal, aquele fotógrafo, ou aspirante, sabe o que aconteceu, estava lá na cena que registrou, onde foi e sob quais circunstâncias. Então, por que atribuir uma história que não existiu? E agora, neste mundo digital onde as pessoas querem alcançar a perfeição a todo custo, a fotografia virou um mero instrumento de brincar de ser divino; e assim os pássaros começam a ter cores extravagantes, os horizontes se tornam imagens psicodélicas e os insetos ficam tão coloridos que nem mesmo eles se reconheceriam num espelho. Foi-se o tempo das cores reais ou em tons pastéis.
A interferência está institucionalizada, e as legendas ainda mais banalizadas.
Talvez a sociedade tenha esta necessidade inerente à observação de uma fotografia;  a de quantificar, mistificar, endeusar a imagem e, por conta disto, quem a produziu.
Susan Sontag escreveu: “Todas as fotos esperam sua vez de serem explicadas, ou deturpadas, por suas legendas”.
Sem questionar o gosto pessoal de distorcer a própria imagem que registrou, todo fotógrafo tem uma grande responsabilidade, como ser humano que é, de atribuir à sua obra a exata informação sobre a cena que documentou. Pode até haver um polimento na história, mas não uma distorção. Afinal, polir é dar brilho; distorcer é alterar.
Se existe a premissa de que a fotografia eterniza um momento, que cada um possa ser nobre o suficiente para eternizar uma verdade. 

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